31 de julho de 2012

O escuro


« O problema é deixar o escuro entrar na cabeça da gente »
Mia Couto

22 de julho de 2012

II


O doce entorpecimento do corpo do viajante que produz um filme mental tecido a partir da imagem visual e do som que circunda os seres. 

20 de julho de 2012

I


A sensação catártica da escrita, de quebrar margens e alargar horizontes, de trazer para fora o que é de dentro, de ser uma alma ironicamente perdida, dona de uma liberdade absoluta. 

3 de julho de 2012

Sophia

"Apesar das ruínas e da morte
Onde sempre acabou cada ilusão,
A força dos meus sonhos é tão forte,
Que de tudo renasce a exaltação
E nunca as minhas mãos ficam vazias."

20 de junho de 2012

pórtico


O mar bate na encosta e os sargaços que outrora integravam o "eu" estão à superfície, balouçam sem rumo.
A minha vontade leva-me para terras onde a natureza floresce e se exibe ao primeiro raio de sol; o meu dever acorrenta-me aqui e faz-me sangrar por dentro.
Por isso uso a máscara já gasta, de outros carnavais, outras instâncias de dor.
O problema é que ela acaba sempre por cair.
Na solidão.

5 de junho de 2012

eles esquecem-se


Fecharam o passarinho na gaiola e com ele todos os sorrisos. Só que o sonho não tem amarras.

3 de junho de 2012

(Re)descobertas

Hoje conheci o já conhecido. Uma descoberta utópica, intrigante, banal, ridícula. E é este carácter insuportável, raivoso e estúpido que provoca a desmaterialização de uma questão dogmática, aceite sem fundamento. 
É quando me apercebo da volatilidade das (in)certezas que concluo - a mente humana é deveras insolente. 

27 de fevereiro de 2012

primavera

E foi quando um aroma doce lhe encheu as narinas e o coração. Foi quando o sol decidiu mostrar o seu lado majestoso. Foi quando os pássaros decidiram levantar voo e viajar pelo mundo inteiro. Foi quando as pernas quiseram pular estrada fora. Foi quando os olhos quiseram olhar e ver tudo. Tudo.
As flores quiseram flutuar ao sabor do vento e as árvores quiseram pintar-se de cores vivas. O calor esquenta a pele, oferecendo bem-estar sem pedir nada em troca.
A natureza solta assim um cântico inaudível mas feliz que só alguns sentem ou estão dispostos a sentir. Envolve-nos assim nesta sinfonia de odores, de brisa suave que puxa o cabelo para os olhos. Inspira-nos, arranca-nos sorrisos tolos, faz os sonhos voarem mais alto. E eu que tinha os meus presos por um cordel de estrelas.

15 de fevereiro de 2012

metafísica intemporal

Há quem diga que há tempo para tudo. Para mim, o tempo é apenas uma palavra aborrecida que insiste em limitar os sorrisos, a ânsia de viver, de ser mais e maior. O tempo? Somos nós que o tecemos, que o cultivamos, que geramos no nosso ventre. 
O tempo é nada e é tudo. Eu gostava de ser tudo mas há momentos em que sou simplesmente nada. E o ser humano deve saber ser nada, deve saber-se humildar perante a vida, perante o destino, perante a metafísica.
Afinal de contas, o que somos nós?

8 de fevereiro de 2012

intermitência sem gente


Este copo de leite vazio que ainda me aquece as mãos geladas. Esta luz pálida e reconfortante que traz à vista a sombra de quem sou. Poderia ficar aqui, na beira da cama, durante horas, a pensar, a olhar, ora para o chão, ora para as paredes, para a cama, para o tecto. Em silêncio poderia pôr mil ideias em ordem, fazer duzentas anotações mentais, calcular trezentas e cinquenta e uma hipóteses, poderia deitar-me e dormir. 
Mas não. Há que ficar aqui a olhar sem ver, a pensar sem lógica, a divagar, a flutuar sobre mim. E como é bom poder ouvir o silêncio que enche este espaço, que se enfeita de grandiosidade infinita e graciosa. Como é bom poder estar na beira da cama sem eira nem beira, nesta intermitência sem gente, neste impasse vagabundo, nesta melancolia sem passado nem futuro. Como é bom não decidir, não julgar, não ponderar. Como é bom saborear esta ataraxia solitária em plena madrugada. Como é bom despir-me de quem sou e vestir a sombra de quem sou por breves momentos. Momentos finitos, momentos que se perdem num lugar abstracto.